de Ricardo Noblat
Quer saia logo do governo ou não, Carlos Lupi, ministro do Trabalho, garantiu modesta nota de pé de página em livro de História sobre o governo Dilma Rousseff como o auxiliar que mais constrangeu a presidente antes de levar finalmente um merecido pé na bunda.
Até aqui, pelo menos, trata Dilma como se ela não passasse de um desdentado tigre de papel.
Diga-se a favor de Lupi que ele não foi o único a resistir a deixar o cargo.
Salvo Nelson Jobim, ministro da Defesa e afilhado de casamento de José Serra, os demais desabrigados do governo em sua fase inaugural foram embora contrariados ou cuspindo fogo. Afinal, ser ministro é muito bom. Todos o cortejam e paparicam. Sem falar das vantagens que de fato importam.
O fogo cuspido por um ou outro não provocou mossa em Dilma - longe disso. Ela foi hábil ao lidar com as diversas situações.
Antônio Palocci, ministro da Casa Civil, por exemplo, saiu sob aplausos. Os olhos de Dilma ficaram marejados.
Só faltou uma orquestra de metais para embalar com músicas épicas a saída triunfal de Orlando Silva do ministério do Esporte. Foi emocionante!
Alguém estranho aos nossos costumes – um nórdico ou anglo-saxão - teria dificuldade em entender por que se demite um ministro e depois se junta um coro de carpideiras para chorar sua saída.
Somos latinos e melífluos, essa é que é a verdade. E também cínicos por natureza.
Lupi dispensou choro, vela e tapinhas nas costas. Aproveitou sua condição de único e inquestionável donatário do PDT fundado por Leonel Brizola para falar grosso, dizer desaforos e comportar-se como se lhe coubesse dirigir a cena protagonizada por ele mesmo.
Quis ser valente – foi apenas vulgar. Tentou fazer graça – pareceu um cafajeste.
O grosso: “Conheço a presidente Dilma há 30 anos. Duvido que ela me tire. Nem na reforma ministerial”.
O desaforado: “Daqui ninguém me tira. Só se for abatido à bala. E tem de ser bala de grosso calibre porque sou pesado”.
O vulgar: “Sou osso duro de roer”.
O cafajeste: “Presidente, me desculpe se fui agressivo. Dilma, eu te amo”.
Se não tivesse outros motivos para demitir Lupi, Dilma ganhou de graça um poderoso e definitivo motivo ao ouvir dele em depoimento no Congresso o debochado pedido de desculpas.
“Dilma, eu te amo” é a maneira mais sarcástica de tirar de alguém a majestade do seu cargo e de reduzir-lhe a autoridade.
Deveria ter sido despachado no ato. Mas o tigre só miou.
A soberba de Lupi voltou a se manifestar quando ele foi homenageado na última sexta-feira pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro.
Agarrado à calça que a todo instante ameaçava deixá-lo só de cuecas, Lupi prometeu como se lhe sobrasse poder para tanto: “Vou acabar com o ciclo de ministros demitidos no grito. Ah, vou!”.
Dilma pensou a mesma coisa quando Lupi começou a ser atingido por denúncias de malfeitos. Disse a um assessor: “Não, não vou deixar que a imprensa derrube um ministro a cada semana”.
Evoluiu depois para a posição de demitir Lupi ao reformar seu ministério. Não está mais certa disso depois de ter lido a VEJA no fim de semana.
Ali resta provado que Lupi mentiu ao Congresso ao negar que tivesse voado em jatinho de empresário. E que mentiu novamente ao fingir que mal conhecia Adair Meira, um gaúcho dono de ONGs.
Lupi viajou pelo interior do Maranhão no jatinho King Air de Meira. E mais: na companhia do próprio Meira, aquinhoado depois com contratos suspeitos no governo.
Roubar nas barbas do presidente não é necessariamente razão para ser demitido. Não é mesmo.
Ao lotearem seus governos com os partidos, os presidentes sabem que pagarão o preço de fechar os olhos a pequenos grandes roubos.
Mas mentir ao Congresso, por mais que o Congresso seja uma casa de mentiras, é um crime grave. Ou assim deveria ser encarado.
A se admitir que nada aconteça ao ministro de Estado que mente diante dos representantes do povo, o melhor é decretar de uma vez por todas que vivemos em uma falsa democracia. E que o servidor público número um, o presidente da República, é também o farsante público número um.
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