de Ricardo Noblat
Eis a questão: Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda, será o novo chefe da Casa Civil do próximo governo? Ou acabará nomeado para outro ministério com gabinete dentro ou fora do Palácio do Planalto – pouco importa?
A Casa Civil é o coração do governo. Palocci ali significará Lula 3. Palocci em qualquer outro lugar significará Dilma 1.
Foi Lula quem escalou Palocci para fazer parte do primeiro escalão da campanha de Dilma. Não foi ela que o escolheu. Se depender de Lula, Palocci ocupará o cargo de chefe da Casa Civil.
É pela Casa Civil que passam todos os atos do governo a serem publicados no Diário Oficial. Uma Casa Civil desidratada de certos poderes nem por isso deixará de ser poderosa.
Se não tivesse sido arrastado pelo escândalo do pagamento de propinas a deputados dispostos a votarem na Câmara conforme a vontade do governo, o ex-ministro José Dirceu poderia ter saído da Casa Civil para ser candidato à sucessão de Lula.
Provavelmente se elegeria. Foi dali que Dilma saiu para se eleger.
Lula faz de conta que não se mete com a formação do novo governo. Afinal, pegaria mal junto ao distinto público aparecer como tutor da presidente eleita. Mas é só o que ele tenta ser.
Outro dia cometeu o ato falho de dizer que Dilma deveria se sentir à vontade para montar seu governo como bem o desejasse.
Por falta de cabimento, jamais se ouvira algo parecido da boca de outro presidente em fim de mandato.
OK, Lula é diferente de todos. O fato é que na história recente do país, a situação de Dilma lembra a de José Sarney, o vice que com a morte de Tancredo Neves se tornou o primeiro presidente civil depois da ditadura militar de 64.
Sarney herdou um ministério nomeado de véspera por Tancredo. Governou com ele durante mais de um ano. E mesmo quando reformou o ministério, seguiu até o desfecho do seu mandato como refém do PMDB, o partido de Tancredo e de Ulysses Guimarães, na época o condestável da Nova República.
Do fim da eleição para cá, saiu de cena a Dilma que fazia tremer os colegas de governo – e que um dia fez chorar o presidente da Petrobras. Sim, esse mesmo que Lula quer manter no lugar.
A Dilma briguenta, do “vamos à luta” contra José Serra e aqueles empenhados em interromper a reinvenção do Brasil, foi arquivada quando prometeu governar para todos os brasileiros.
Entrou a Dilma que chora em público. Que rende homenagens ao PT. E se diz decidida a governar com todos os partidos que a ajudaram a se eleger – e mais aqueles que se ofereçam para apoiá-la daqui para frente.
A nova Dilma é um personagem ainda em construção. Sem dúvida, muito mais atraente e complexo do que o outro.
Cultiva uma preocupação que faz sentido. Enquanto Lula não quer ser visto como o mandão contumaz, ela não quer ser vista como a ingrata, a desleal, aquela que mal foi eleita deu logo as costas para o principal responsável por sua eleição.
Outro dia, Dilma também incorreu num ato falho ao dizer que “presidente não precisa ser celebridade”.
Feita por Serra, por exemplo, a observação soaria como uma crítica a Lula, que persegue os holofotes e terá dificuldades para viver longe deles.
Feita por Dilma foi entendida como a antecipação de um novo estilo de governar. Mais para o recato do que para o exibicionismo. Para a modéstia do que para a arrogância. Tomara que assim seja.
Não existe almoço grátis, costumam repetir os economistas. Alguém sempre paga a conta.
Também não existe eleição grátis. É o que parece querer dizer Lula quando se apressa em indicar aspirantes a peças chaves do governo Dilma – Guido Mantega, Palocci, Henrique Meirelles, Paulo Bernardo, Nelson Jobim e Gilberto Carvalho, entre outros.
Pobre Dilma.
Ganhou o direito de suceder a Lula. Agora luta em silêncio e com uma habilidade insuspeitada para ganhar também o direito de governar. Assim como aconteceu com Sarney, que um dia afirmou: “Você governa o governo. Mas você não governa o tempo que governa”.
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