Impregnado de soberba pelos altíssimos índices de popularidade ao longo de quase oito anos de governo, o presidente Lula tem dado inúmeras demonstrações de que pensa estar acima de tudo e de todos. A Justiça eleitoral que o diga.
São conhecidas suas tiradas e improvisos em declarações oficiais e de campanha, bem-humoradas umas, exageradas algumas, despropositadas outras. Ao longo do tempo, a reação passou a ser “mais uma do Lula”, e deixa para lá. Mas, na política externa, as declarações do presidente têm causado estragos.
É o que aconteceu com afirmação sobre o incidente entre Venezuela e Colômbia. Lula disse não ver ali um confronto, apenas “um conflito verbal” e pediu paciência até a posse do presidente eleito da Colômbia, Juan Manuel Santos, dia 7.
Ele ignorou solenemente que o cerne do problema não é o presidente colombiano Alvaro Uribe, em despedida do cargo, nem o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Mas, sim, a presença de 1.500 homens das narcoguerrilhas colombianas Farc e ELN em território venezuelano, conforme alerta de Bogotá.
Uribe denunciou o fato de o governo da Venezuela nada fazer para impedir que essas forças terroristas, que lutam para desestabilizar a Colômbia, permaneçam em solo venezuelano, fora do alcance do Exército colombiano. Em resposta, Chávez rompeu as relações com Bogotá.
O pior para o governo brasileiro é que Uribe criticou publicamente as afirmações, deplorando “que o presidente Lula se refira à nossa situação com a Venezuela como se fosse um caso de assuntos pessoais (...)”.
Neste final de mandato, o governo brasileiro acentuou o caráter ideológico de sua política externa, com péssimo resultado para a credibilidade do país, principalmente como interlocutor confiável na resolução das divergências entre os países sul-americanos.
Nesse caminho, a diplomacia brasileira abre mão de parâmetros éticos quando finge não ver grave desrespeito aos direitos humanos em Cuba; quando finge ver “excesso de democracia” (nas palavras de Lula) na Venezuela; quando finge que as Farc não são uma organização narcoterrorista; quando finge acreditar nos propósitos nucleares da ditadura do Irã, quando deseja apenas espicaçar os Estados Unidos, e ainda faz vista grossa ao atropelamento dos direitos humanos por Ahmadinejad.
Uma das características da diplomacia lulista foi ressuscitar o viés esquerdista e antiamericano de alguns líderes populistas do chamado Terceiro Mundo de 50 anos atrás. Um dos exemplos disso é a Unasul, organização criada para se contrapor à OEA, e que por isto exclui os Estados Unidos.
Tão artificial é a idéia de que os problemas no continente possam passar ao largo de Washington que a própria reunião da Unasul sobre o conflito entre Venezuela e Colômbia foi esvaziada.
Ao criticar o comportamento brasileiro no episódio, o presidente Uribe chama indiretamente a atenção para o fato de, desde o primeiro mandato, Lula ter mantido uma relação próxima com a Venezuela e fria com a Colômbia. Pena, porque a primeira está cada vez mais próxima de uma ditadura efetiva — a chavista. E a segunda, apesar dos inúmeros problemas internos, tem conseguido aperfeiçoar sua democracia.
O lulismo prefere más companhias, por simples viés ideológico.
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